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segunda-feira, 11 de setembro de 2023

A lista de Cyro

 

Quando o assunto é clichê, lembro-me do tempo em que fui aluno do escritor Cyro dos Anjos na Universidade Federal do Rio de Janeiro.

A disciplina era Oficina Literária, e o autor de “O amanuense Belmiro”, “Abdias”, “Montanha” e outros bons romances na linha machadiana frequentemente nos alertava para o risco das chapas.

Certa vez nos entregou uma relação com várias delas. Guardei esse papel, que utilizo para prevenir os alunos contra a armadilha do lugar-comum.

Eis alguns clichês que constam na lista de Cyro: implacável destino, esposa exemplar, insidiosa moléstia, virtudes imarcescíveis, radiosa manhã, irresistível impulso, olhar glacial, perigoso meliante, nobre colega, vasto repertório, etc. etc.

É preciso fugir deles como o diabo da cruz (acabei de usar um!).

terça-feira, 5 de setembro de 2023

O que é a paródia


       A PARÓDIA é um dos procedimentos mais comuns da Modernidade; por meio dela o artista geralmente ironiza o sentido da obra original, visando a uma reflexão crítica sobre os parâmetros tradicionais da arte. É o que faz Marcel Duchamp com a Mona Lisa, o famoso quadro de Leonardo da Vinci. Na obra original, a mulher retratada aparece como um enigmático modelo de serenidade, que se acentua devido ao esfumado da composição; na versão de Duchamp (conhecida como L.H.O.O.Q), ela ganha barba e bigode – o que constitui uma espécie de ofensa ao ideal clássico de beleza feminina.


Sobre a hipálage

         

       A hipálage é uma construção em que não se respeita a distribuição lógica dos termos sintáticos. Ocorre quando se diz, por exemplo, que alguém “enfiou o chapéu na cabeça” (em vez de “enfiou a cabeça no chapéu”). Ou quando se desloca a posição do adjetivo em relação ao substantivo que ele modifica. É o que ocorre nesse exemplo de Augusto dos Anjos. O adjetivo  “necrófago” se refere a mosca e não a apetite. Objetivamente, o que se tem é: “O apetite da mosca necrófaga”. Vejam que o poeta não alterou a posição do adjetivo apenas para melhorar o ritmo ou manter a rima. Seu objetivo foi também ampliar-lhe a carga semântica; a necrofagia passou a qualificar o apetite sem deixar, contudo, de se referir ao inseto.